domingo, 9 de dezembro de 2012

Amor ilusório



O Brasil é um país extremamente religioso, vários credos convivem juntos numa diversidade religiosa impressionante. Dentre as várias religiões existentes a maior delas é o cristianismo com suas diversas ramificações. A cada dia surgem novas igrejas com nomes dos mais exóticos. Diante de tanta diversidade e das doutrinas tão divergentes há um pensamento comum a todas elas- o pensamento de que o ser humano foi criado à imagem e semelhança de Deus e por isso, todo homem, mulher e criança tem um valor intrínseco e inalienável como ser humano. Dentro dessa visão o cristão deveria libertar as pessoas de tudo que seja desumanizante.
Na teoria parece ser fácil se preocupar com as mazelas dos outros a ponto de se envolver pessoalmente, mas na prática isso raramente acontece. O discurso pode ser tão comovente a ponto de levar às lágrimas, mas só discursar com eloqüência não basta. Entre o mero discurso e a ação há um abismo que precisa ser transposto urgentemente. Centenas de livros já foram escritos sobre a importância de ajudar os mais necessitados, milhares de sermões foram pregados do púlpito de igrejas das mais diversas correntes religiosas ensinando o crente a amar o próximo como a si mesmo. O amor é exaltado como o maior dos dons. Líderes religiosos proclamam que o amor a Deus sobre todas as coisas e ao próximo como a si mesmo é a essência da vontade de Deus para a humanidade. As palavras são belíssimas e momentaneamente toca os corações, infelizmente, logo a comoção vai embora e junto com ela todo o entusiasmo inicial de muitos ouvintes. 
Em qualquer igreja cristã que você visitar será fácil perceber que há tantas programações a serem feitas e as pessoas estão tão ocupadas com as suas diversas atividades religiosas que o que deveria ser o mais importante para a igreja (as pessoas) acaba ficando em segundo plano. Logicamente que ninguém é negligente com as necessidades alheias intencionalmente, mas por incrível que pareça, o religioso que tanto defende e exalta o amor desinteressado por todas as pessoas muitas vezes cai na armadilha de cuidar, proteger e defender mais da sua organização religiosa do que do próprio ser humano.
Certo religioso foi procurado por uma mulher desabrigada em busca de auxilio. Ele- muito sincero, sem dúvida, mas também muito ocupado e não sabendo como ajudá-la- prometeu orar por ela. Posteriormente a mulher escreveu este poema e entregou-o a um dos líderes religiosos da comunidade:
Eu tive fome,
e tu formaste um grupo humanitário
para discutir minha fome.  
Estive preso
e tu te retiraste discretamente para a tua capela
e oraste pela minha libertação.
Estava nua
e, na tua mente, questionaste
a moralidade de minha aparência.
Estive enferma
e tu te ajoelhaste e agradeceste a Deus por tua saúde.
Estava desabrigada
e tu me falaste do abrigo espiritual do amor de Deus
Estava solitária
e tu me deixaste sozinha a fim de orar por mim,
Parecias tão santo, tão próximo de Deus!
Mas eu ainda estou com fome... e sozinha... e com frio.             

O mundo fora das quatro paredes de uma igreja é bem diferente da sua realidade interna. A igreja precisa refletir seriamente sobre o seu real papel numa sociedade cada vez mais carente de cuidados. Que ninguém mais procure a ajuda da igreja e volte para casa se sentindo com fome, sozinho e com frio. O amor precisa ser real e não apenas um amor ilusório.

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